Entrevista coma Dra. Paula Dall Stella ao Jornal 140, fala sobre sua experiência com a Cannabis Medicinal.
Principais trechos:
Infelizmente ainda não tem uma especialidade Canabidiologia dentro da medicina. Acredito que isso vai acontecer. É necessário, daqui alguns anos teremos como especialidade, médicos canabidiologistas. Não é uma especialidade, porém é a área da minha atuação que escolhi trabalhar há cinco anos.Experiência com Cannabis - o inicio
Comecei a acompanhar pacientes em uso de Cannabis Medicinal. Por uma experiência pessoal acabei descobrindo a Cannabis Medicinal, com uma ótima alternativa para muitas doenças. É uma substância que ajuda de fato para muitos pacientes. Um assunto vastíssimo, o sistema Canabinóide a gente tem pouco conhecimento diante da tamanha complexidade. É um sistema que interfere em todos os outros sistemas de nosso organismo. É uma comunicação entre o cérebro e o corpo, que está sempre tentando nos levar a um processo de equilíbrio. Imagina, um sistema que se comunica com todos os outros sistemas do nosso corpo, que tem uma importância impar. Portanto, quando tem uma alteração desse sistema a gente fica doente. Então conhecê-lo a fundo é de extrema importância, principalmente para o médico que quer trabalhar com Cannabis Medicinal.Tumores cerebrais
Eu tive uma experiência pessoal [com Cannabis], com paciente Neuro-oncologico, por intermédio de alguns amigos. Sempre pesquisei muito esse assunto na tentativa de ajudá-lo [paciente], até porque alguns tumores cerebrais não tem cura. E aí, eles mostraram um vídeo, de uma pesquisadora chamada Cristina Sánchez [Espanha], estuda tumores cerebrais e outros tipos de câncer e como a Cannabis interfere nesses tumores, todo o processo antineoplásico da Cannabis, como funcionaria isso nos tumores. Me chamou muita atenção, me interessei pelo assunto, comecei a estudar e esse paciente acabou sendo meu primeiro, aonde eu pude notar uma incrível melhora na qualidade de vida dele, enquanto fazia uso da Cannabis, durante a quimioterapia. Experiência positiva com Cannabis: Ele era um paciente que ficava cinco dias sem comer, muitas vezes com intestino preso, ele não evacuava cinco, seis dias, por conta dos medicamentos que ele usava para controle das náuseas e vômitos. E quando ele passa a usar Cannabis, ele só não necessita mais usar esse tipo de medicamento, também começa a comer três vezes ao dia, invés de ficar no escuro, ele pedia para dar uma volta na quadra. Ele ia ao banheiro, porque agora ele estava tomando água e comendo e não precisava mais utilizar aquelas medicações, enfim foi um impacto muito grande na qualidade de vida dele.Experiência com Cannabis - Pesquisas
Aquilo me chamou atenção, uma vontade muito grande de contar isso para as pessoas, de trabalhar com isso, enfim de estar envolvido com esse tipo de situação. Comecei a pesquisar, entrei em contato com os maiores pesquisadores na época, inclusive com Manuel Gusmão, um grande professor nesse meu caminho, também a frequentar os congressos internacionais, que não sabia da existência. Congressos seríssimos, não sabia que existia tanto ciência por trás disso e tantas pessoas comprometidas com esse assunto. E pesquisando a fundo de fato, o impacto que esse sistema tem em nossa saúde. O mais interessante ainda é que nos produzimos substâncias mimetizam [adquirem] a Cannabis. Então como é que tudo isso se relaciona no nosso organismo e quais as alterações desse sistema quando a gente está doente. Comecei a entender também que a doença era uma manifestação do estilo de vida desses pacientes. Então hoje minha área de atuação, não é só na Cannabis Medicinal, trabalho medicina do estilo de vida, medicina integrativa, funcional, entender onde o estilo de vida daqueles pacientes também estavam causando ou acentuando os sintomas ou própria doença.Cannabis é cientifico
Existem médicos ainda, infelizmente, que não querem saber, falam para os pacientes que não tem comprovação cientifica, orientam os paciente não irem atrás ou não utilizarem esse tipo de medicamento durante o tratamento com eles. Uma grande maioria dos médicos já entendeu que isso não é uma opinião pessoal, existe uma ciência por trás disso. A minha postura sempre é relacionado a ciência. Estudo os benefícios, tenho pacientes no consultório que fazem uso da substância para diversas doenças. Então, eu vejo no consultório, quando falo desse tema em palestras e congressos, trago o que tem de ciência comprovado.Cannabis não mata Neurônios
É uma crença popular, principalmente pelos usuários recreativos que fumam a Cannabis e naquele período dizem que ficam esquecidos, isso era erroneamente relacionado a morte neuronal. Isso não acontece, ao contrário, a Cannabis é Neuroprotetora, anti-inflamatória, antioxidante. Ela atua no nível cerebral de uma forma completamente diferente de matar neurônios, ela faz exatamente o oposto. Ela está muito relacionada inclusive a sobrevivência e nascimento neuronal.Explicação ao paciente
Eu explico a ciência para o paciente e nas consulta desmitificamos as ideias não verdadeiras. O canabidiol vemos em doenças neurodegenerativas. Nós temos receptores canabinóides no corpo inteiro. Quando utilizamos o medicamento de Cannabis age no corpo inteiro, não tem como somente estimular a fome, estimulará a fome, alterará o equilíbrio, ficará menos ansioso, enfim são várias ações ao mesmo tempo, porque ela atuará em vários receptores ao mesmo tempo, em vários órgãos, sistemas. O mais importante é o paciente entender isso e saber como lidar com uma situação não prazerosa caso aconteça por causa da medicação. Quanto mais o paciente tiver ciência e consciência do que está fazendo [experiência com Cannabis], mas ele saberá lidar com essa medicação e menos efeitos colaterais sentirá.Não é para todos
Todo o medicamente tem um momento que deve ou pode utilizá-lo. Não é correto dizer que todos os antidepressivos são ruins e agora utilizaremos a Cannabis para salvar o planeta. Não é dessa forma que se faz medicina. A Cannabis não é um medicamento para todos. Os medicamentos antidepressivos também tem seu momento de utilidade, acontece que as pessoas começam a utilizá-los e vão cinco, dez anos, e isso tem um impacto gigantesco no organismo. Toda as vezes que colocamos um medicamento sintético no corpo tem um efeito colateral, que não queremos a longo prazo. Percebo que os pacientes estão procurando medicamento mais naturais, mais saudáveis.
Experiência com Cannabis - Oncologia
A Cannabis no universo oncológico estimula o apetite, melhora o paladar, o humor, a qualidade do sono, analgésica, protege das dores neuropatia periféricas induzida pela quimioterapia. Tem uma gama de ações, costumo dizer que não tem nenhum medicamento que é cinco em um e ela é. Tenho muitos pacientes com dores crônicas, doenças neurodegenerativas, autoimunes, depressão, insônia e ansiedade.
Experiência com Cannabis - diversidade
Então, é bem diversificado, em algumas doenças raras estamos na dúvida se a Cannabis ajuda ou não. O fato dela ser uma substância extremamente segura, eu me sinto confortável de tentar com esses pacientes o que a medicina [tradicional] as vezes não consegue, ela tem um limite de atuação. E com a Cannabis as vezes consegue aumentar a qualidade de vida desses pacientes. Costumo dizer que a Cannabis não cura, ela não é um tratamento curativo, mas ela consegue aumentar a qualidade de vida. Então, ela ajuda de qualquer forma. Os pacientes que a utilizam conseguem controlar seus sintomas de uma forma melhor.
Experiência com Cannabis - Estilo de Vida
Se observamos o estilo de vida desses pacientes, [muitas vezes] é o que está levando a ficar doente. A Cannabis é uma ferramenta que pode ajudá-lo a controlar melhor os sintomas daquela doença, o que curará é a descoberta da causa raiz do problema dele. A medicina de estilo de vida, a medicina funcional, integrativa, o olhar dela é muito cauteloso para tentar entender o que você faz, o que você come, quantas horas você dorme, o sono é reparador, a capacidade de desintoxicação do seu corpo, gosta do trabalho, pratica atividade física, como estão os hormônios, equilíbrio endócrino do seu organismo. Tudo isso conta, na hora de avaliar um paciente e entender a doença que ele tem.
Experiência com Cannabis - Diminuição de medicamentos
Tenho pacientes que chegam no meu consultório tomando 15 medicamentos que atuam no sistema nervoso central, por conta de transtorno de ansiedade e dor crônica, por exemplo. Quando você faz todo o equilíbrio da atividade física, hormonal, do sono, a Cannabis, etc, esses paciente conseguem se livrar de muitas medicações, que de fato não está tendo o efeito significativo. O paciente chega nos consultório com os mesmos problemas, a mudança de estilo de vida teve um impacto real na qualidade de vida desse paciente. A Cannabis muitas vezes, o próprio canabidiol, utilizamos para diminuir ansiedade, enquanto ele está fazendo essa transição, retirando alguns medicamentos. Eu percebo, a Cannabis é uma substância numa gama de atuações, mas se de fato não for na causa raiz e não mudar alguns aspectos do estilo de vida daquele paciente, o ganho será muito pequeno. Quando se faz tudo junto, o ganho é muito maior.
Experiência com Cannabis - Vício
O canabidiol é uma substância que não vicia, porque a atuação nos nossos receptores e o próprio envolvimento psicológico da substância, não causa nenhum tipo de vício. Eu tenho um caso emblemático de um paciente que fumava dez cigarros de [maconha] por dia, começamos a tentar desintoxicar esse paciente, tirar ele desse estilo de vida. Eles está psicologicamente viciado, muito mais que quimicamente é psicológico, ele vai em busca da sensação. Diferente da nicotina, que o vício do cigarro é dependência química. E o Cannabidiol [medicinal] nesse paciente está ajudando, ele passou para 2 cigarros por dia. É possível ele parar [com o consumo de maconha fumada].
Experiência com Cannabis - Pacientes em estado terminal
A Cannabis tem uma atuação sinérgica com os receptores opioides. Em em situações em que o paciente usa medicamento derivados da morfina, por exemplo, consegue reduzir essas doses com a Cannabis, por isso tem menos efeito colateral. Melhora muito a qualidade de vida. Sabemos que os derivados da morfina impacta no intestino, no sono, no humor. Consegue reduzir a dose, alguns até tirar, com a Cannabis. E o paciente, acaba utilizando o THC, quando falamos em analgesia nesses casos, essa é a substância escolhida.
CBD
Tenho alguns pacientes somente com CBD, conseguiram a analgesia adequada, redução de doses de opioides e hoje fazem uso de canabidiol apenas. Então, isso é muito individual, não é uma regra. Não posso dizer que todos os pacientes terão esse benefício, isso inclusive é uma característica do tratamento com a Cannabis - é muito difícil fazer um protocolo igual para todos e fazer uma afirmativa que todos os pacientes terão esse benefício.
Experiência com Cannabis - Dor
A Cannabis interage diferente entre os indivíduos e as dosagem também. É uma ferramenta muito importante no universo da dor, percebo a melhora desses pacientes, com a junção principalmente das duas substâncias, o THC e CBD. O THC é uma substância importante analgésica na hora que tentamos uma analgesia desse porte.
Alimentação
Eu explico ao paciente porque ele está doente, porque o corpo dele está manifestando uma doença, um dos pilares mais importantes da nossa vida é a alimentação. E pode ser uma das causas de nosso corpo inflamado durante muitos anos. É preciso inflamar o organismo para ter uma doença crônica. Existem vários processos biológicos ao longo dos anos, meu corpo inflama, pode ser via alimentação. O estresses pode ser via alimentação. Podemos alterar hormônios no nosso organismo que se relaciona e nos protege do estresse via alimentação. E essa alteração hormonal, gerará uma alteração do nosso sistema imunológico, que no decorrer dos anos manifestará em forma de doença.
Experiência com Cannabis - O aspecto anti-inflamatório
Pacientes que tem diabetes, que tomam estatina, por exemplo, que tem o colesterol alto elevado, o canabidiol tem o aspecto protetor nas nossas artérias, que de fato baixa a glicemia, ele ajuda no controle da inflamação. Eu não considero preventivo você tomar canabidiol e continuar comendo [o que não deve].
Veja a entrevista na integra
Fonte: Jornal 140